Assim, o mínimo que a gente precisa saber ao se deparar com um canal a ser trabalhado é o que pretende usar, nem que seja somente a princípio. Embora seja óbvio o fato de que os diferentes canais que compõem uma mix interagem, esta interação está longe de ser um obstáculo tão grande a ponto de fazer com que nos confrontemos com uma indefinição. Afinal, se eu ficar indeciso porque a voz interfere no som do bumbo e vice-versa, eu não começo por canal nenhum.
Nesta nossa discussão, vamos nos concentrar nestes dois pontos básicos: vamos entender por que aparece a necessidade de se "mexer" no som de um canal e como se dá o processo de decisão sobre "o que" utilizar. A decisão de qual processador efetivamente usar vai depender de questões subjetivas (o gosto de cada um) e objetivas (o que se tem à disposição), e entrar neste aspecto tornaria nossa conversa aqui um tanto inútil (determinar como escolher o modelo de equalizador, por exemplo, seria exaustivo e não estaria ajudando muito, porque, como diria famoso político, estaríamos "dando o peixe, e não ensinando a pescar").
Antigamente, antes da chegada das DAWs (Digital Audio Workstation - Pro Tools e similares), havia certa "facilidade" neste aspecto. A gente simplesmente não tinha ferramentas suficientes. Tinha um equalizador por canal na mesa, mais uns poucos processadores no rack e olhe lá. Se a mesa fosse realmente bacana, tínhamos o luxo de um compressor por canal, o que facilitava bastante, mas daí até a gente poder escolher qual equalizador ou qual compressor queria usar havia uma enorme e intransponível distância.
Quando vejo hoje em dia alguém usando seis ou sete reverbs em uma música fico pensando como esta pessoa faria naquelas épocas. E não estou falando de muito tempo atrás, não. Até meados da década de 1990 era basicamente isso: poucos recursos e muita criatividade.
Mas o que será que determina se precisamos ou não moldar o som de um canal?
INTERAÇÃO DE INSTRUMENTOS
Imaginemos um recital de música clássica em que uma cantora interpreta
uma peça acompanhada de uma orquestra de cordas. Será que o som que sai dos
violinos muda o som da voz? Ou será que a voz muda o som dos violinos? De fato,
ouvir voz e violinos é diferente de ouvir cada um em separado, mas a interação
deles é um fator artisticamente construtivo, e não destrutivo. Como não há
jeito de "equalizar" os violinos ou a cantora acusticamente, por que
será que surge a necessidade de fazê-lo eletronicamente, num ambiente de
mixagem?
A primeira diferença é o jeito como se grava. A situação em que ouvimos uma cantora e uma orquestra de cordas ao vivo (e sem amplificação) equivale eletronicamente a colocarmos um microfone estéreo na mesma posição e altura de nossos ouvidos. Desta forma, na "mixagem", certamente não precisaríamos mexer nem no som de um nem de outro (descontando momentaneamente as colorações provocadas pelo microfone). Na verdade, este tipo de gravação é extremamente realista, e existem situações, tipicamente na música clássica, em que se grava exatamente assim: numa sala de concerto com uma acústica excepcional, com apenas dois microfones estrategicamente colocados. Um belo exemplo é Moussorgsky: Pictures at an Exhibition/Night on The Bald Mountain, com Lorin Maazel regendo a Cleveland Orchestra, da Telarc/Lim, que mesmo sendo uma gravação de 1979 (uma das primeiras gravações em digital a aparecer no mercado), continua em catálogo. É uma performance fantástica e o som é de tirar o fôlego. Pode ser encontrada em diversas lojas na internet, como na Amazon, em http://tinyurl.com/nightmountain.
Porém existem dois aspectos importantes a considerar. Gravar deste jeito nos impede de mexer à vontade no som de cada instrumento, e nem sempre as performances de todos os músicos são equivalentes em termos de qualidade. Assim, em nome de termos o poder de controlar à vontade (dentro de certos limites) o som de cada instrumento, gravamos em separado e/ou colocamos os microfones mais próximos a cada um deles. E este jeito de gravar, embora seja extremamente útil, é, infelizmente, completamente antinatural. Não quer dizer que a falta de naturalidade seja ruim. Nada nos obriga a ficarmos presos à naturalidade de uma situação. A possibilidade de mexer diretamente em cada canal é uma ferramenta criativa importante e por isso universalmente utilizada.
Vejamos o caso da bateria, por exemplo. Não há nada menos natural do que colocar um microfone a dois centímetros de distância da pele de cada tambor, ou do hi-hat. Ninguém ouve bateria desta forma. Porém, o poder que isto nos proporciona é imenso. E a coisa é tão poderosa que hoje em dia o som de uma bateria gravada é uma entidade que não tem muito a ver com a experiência de se ouvi-la acusticamente. Experimente entrar numa sala onde uma bateria esteja sendo tocada e perceba se o que você ouve chega ao menos perto do que escuta em um CD. É totalmente diferente. Não estou discutindo aqui o que é "melhor", pois isto é uma questão subjetiva. Objetivamente, porém, o som da bateria moderna gravada (principalmente na música pop) é uma construção que todos nós acostumamos.
A primeira diferença é o jeito como se grava. A situação em que ouvimos uma cantora e uma orquestra de cordas ao vivo (e sem amplificação) equivale eletronicamente a colocarmos um microfone estéreo na mesma posição e altura de nossos ouvidos. Desta forma, na "mixagem", certamente não precisaríamos mexer nem no som de um nem de outro (descontando momentaneamente as colorações provocadas pelo microfone). Na verdade, este tipo de gravação é extremamente realista, e existem situações, tipicamente na música clássica, em que se grava exatamente assim: numa sala de concerto com uma acústica excepcional, com apenas dois microfones estrategicamente colocados. Um belo exemplo é Moussorgsky: Pictures at an Exhibition/Night on The Bald Mountain, com Lorin Maazel regendo a Cleveland Orchestra, da Telarc/Lim, que mesmo sendo uma gravação de 1979 (uma das primeiras gravações em digital a aparecer no mercado), continua em catálogo. É uma performance fantástica e o som é de tirar o fôlego. Pode ser encontrada em diversas lojas na internet, como na Amazon, em http://tinyurl.com/nightmountain.
Porém existem dois aspectos importantes a considerar. Gravar deste jeito nos impede de mexer à vontade no som de cada instrumento, e nem sempre as performances de todos os músicos são equivalentes em termos de qualidade. Assim, em nome de termos o poder de controlar à vontade (dentro de certos limites) o som de cada instrumento, gravamos em separado e/ou colocamos os microfones mais próximos a cada um deles. E este jeito de gravar, embora seja extremamente útil, é, infelizmente, completamente antinatural. Não quer dizer que a falta de naturalidade seja ruim. Nada nos obriga a ficarmos presos à naturalidade de uma situação. A possibilidade de mexer diretamente em cada canal é uma ferramenta criativa importante e por isso universalmente utilizada.
Vejamos o caso da bateria, por exemplo. Não há nada menos natural do que colocar um microfone a dois centímetros de distância da pele de cada tambor, ou do hi-hat. Ninguém ouve bateria desta forma. Porém, o poder que isto nos proporciona é imenso. E a coisa é tão poderosa que hoje em dia o som de uma bateria gravada é uma entidade que não tem muito a ver com a experiência de se ouvi-la acusticamente. Experimente entrar numa sala onde uma bateria esteja sendo tocada e perceba se o que você ouve chega ao menos perto do que escuta em um CD. É totalmente diferente. Não estou discutindo aqui o que é "melhor", pois isto é uma questão subjetiva. Objetivamente, porém, o som da bateria moderna gravada (principalmente na música pop) é uma construção que todos nós acostumamos.
Pois bem, gravamos as coisas separadas e nos preocupamos
individualmente com a qualidade de cada canal. Quando estamos
"timbrando" um instrumento, estamos otimizando o conjunto formado por
ele mais a sala, o microfone, sua posição, o cabo e o pré-amplificador, de
forma que o resultado gravado seja o mais funcional possível. Não
necessariamente o mais funcional significa o mais "bonito". Como a
gente não sabe ainda o que será preciso fazer neste som quando ele for somado
aos demais, é sempre bom deixar uma margem para manobra. No tempo da fita
analógica a gente tinha já que imprimir um som mais próximo do desejado, por
causa das limitações da mídia. Com os gravadores digitais, porém, posso afirmar
sem medo que não existe a menor necessidade de se equalizar durante a gravação.
Não é proibido fazê-lo, mas também não é necessário. Uma certa compressão pode
ser útil para que os trechos mais suaves não percam qualidade na conversão para
digital, mas se for usado um sistema de 24 bits, arrisco dizer que nem isso é absolutamente necessário.
Resumindo, então, na mixagem a gente precisa realmente
tomar cuidado com a interação dos diferentes canais para que a soma de todos
soe bem, uma vez que o jeito de gravar não leva em conta esta interação. Agora,
o fato deste fenômeno ocorrer não é determinante: é apenas uma consequência do
método.
PROCESSAR É PRECISO?
Tomando então um canal que desejamos inserir numa mix. Um bumbo, por exemplo. Eu estaria gastando o tempo valioso do leitor se ficasse aqui discorrendo sobre todas as possibilidades que enfrentamos nesta situação. Pra quem gosta de matemática, costumo dizer que uma mixagem é um sistema com mais variáveis do que equações, e, consequentemente, pode ter infinitas soluções ou nenhuma solução, mas jamais pode ter uma solução única (confira em Resolução de Sistemas Lineares, de J. M. Martínez e A. Friedlander). Pra quem não gosta, mesmo assim dá pra sacar que não existe "a" mixagem, mas "as possíveis mixagens". Não há mixagem errada, embora haja muitas mixagens certas.
Dizer aqui que cada equalizador tem um som ou um comportamento não ajuda muito. Então, o que buscamos sempre é simplificar. O ser humano tem esse jeito de resolver os problemas, seja pra levantar uma parede ou pra mandar um foguete pro espaço. A gente simplifica um problema grande, transformando-o em algo resolvível. Então, em vez de dizermos que não sabemos o que usar porque esse bumbo tem a sua individualidade e será acompanhado por mais algumas dezenas de canais, precisamos é nos apoiar fortemente na única coisa absolutamente definida quando se começa uma mixagem: a ferramenta que será usada para ouvi-la - nossos ouvidos.
Quando começamos a trabalhar em uma música, a única coisa de que temos certeza é que nossos ouvidos serão nossos guias e nossos juízes, e é por aí que devemos começar. Ou seja, voltando ao nosso bumbo primordial, vamos simplesmente ouvir o que ele tem a dizer. A partir daí a primeira coisa que precisamos gerar é uma opinião a respeito dele.
FORMANDO UMA OPINIÃO
Se eu julgar que um som precisa ser trabalhado e melhorado, o que posso usar para isso? Bom, felizmente as possibilidades não são tantas assim. A princípio, podemos mexer na resposta, em frequência, no volume e na ambiência. Como estamos trabalhando apenas em um canal, podemos momentaneamente parar de nos preocupar com sua interação com os outros. Ocupemo-nos, então, apenas com o som dele. Se julgamos que existem regiões de frequência que precisam ser mexidas, inserimos um equalizador. Se existem muitas variações de volume no canal, podemos inserir um compressor ou atuar no próprio áudio, alterando o ganho de certos trechos.
Tomando então um canal que desejamos inserir numa mix. Um bumbo, por exemplo. Eu estaria gastando o tempo valioso do leitor se ficasse aqui discorrendo sobre todas as possibilidades que enfrentamos nesta situação. Pra quem gosta de matemática, costumo dizer que uma mixagem é um sistema com mais variáveis do que equações, e, consequentemente, pode ter infinitas soluções ou nenhuma solução, mas jamais pode ter uma solução única (confira em Resolução de Sistemas Lineares, de J. M. Martínez e A. Friedlander). Pra quem não gosta, mesmo assim dá pra sacar que não existe "a" mixagem, mas "as possíveis mixagens". Não há mixagem errada, embora haja muitas mixagens certas.
Dizer aqui que cada equalizador tem um som ou um comportamento não ajuda muito. Então, o que buscamos sempre é simplificar. O ser humano tem esse jeito de resolver os problemas, seja pra levantar uma parede ou pra mandar um foguete pro espaço. A gente simplifica um problema grande, transformando-o em algo resolvível. Então, em vez de dizermos que não sabemos o que usar porque esse bumbo tem a sua individualidade e será acompanhado por mais algumas dezenas de canais, precisamos é nos apoiar fortemente na única coisa absolutamente definida quando se começa uma mixagem: a ferramenta que será usada para ouvi-la - nossos ouvidos.
Quando começamos a trabalhar em uma música, a única coisa de que temos certeza é que nossos ouvidos serão nossos guias e nossos juízes, e é por aí que devemos começar. Ou seja, voltando ao nosso bumbo primordial, vamos simplesmente ouvir o que ele tem a dizer. A partir daí a primeira coisa que precisamos gerar é uma opinião a respeito dele.
FORMANDO UMA OPINIÃO
Se eu julgar que um som precisa ser trabalhado e melhorado, o que posso usar para isso? Bom, felizmente as possibilidades não são tantas assim. A princípio, podemos mexer na resposta, em frequência, no volume e na ambiência. Como estamos trabalhando apenas em um canal, podemos momentaneamente parar de nos preocupar com sua interação com os outros. Ocupemo-nos, então, apenas com o som dele. Se julgamos que existem regiões de frequência que precisam ser mexidas, inserimos um equalizador. Se existem muitas variações de volume no canal, podemos inserir um compressor ou atuar no próprio áudio, alterando o ganho de certos trechos.
Agora, qual equalizador especificamente usar? Qual compressor? Pois bem, neste ponto eu vou contar o maior segredo para mixagens felizes e tranquilas: aprenda com tudo o que você fizer. É a velha história da experiência. Em resumo, se a gente aprende com tudo o que faz, vai montando um estoque de soluções para os problemas. E os erros e os problemas ensinam muito mais do que os acertos. Assim, na próxima vez em que você trabalhar em um instrumento, procure memorizar o tipo de solução que usou. Depois de você corrigir uma "cantada" de caixa de bateria atenuando 490 Hz em umas três situações, provavelmente já irá direto nessa frequência na quarta, mesmo que lá na frente seja necessário reajustá-la. Este será o ponto de partida. E quanto a quais plug-ins ou processadores efetivamente usar, depois de um tempo você vai observar que existe um grupo relativamente pequeno de ferramentas que a gente acaba preferindo. Isto não é errado: é apenas producente. Se determinado equalizador lhe deu um resultado bacana hoje, por que não começar usando ele na próxima vez?
Só que a gente não deve esperar até a hora de uma mixagem ou gravação pra valer para testar as ferramentas de que dispõe. Assim que temos acesso a um novo equipamento, plug-in ou processador, precisamos testá-lo o mais rápido possível na maior quantidade de situações que pudermos. Desta forma, estaremos aumentando nosso vocabulário de recursos e já poderemos estabelecer mentalmente em que situações poderá valer a pena usá-lo.
Só que a gente não deve esperar até a hora de uma mixagem ou gravação pra valer para testar as ferramentas de que dispõe. Assim que temos acesso a um novo equipamento, plug-in ou processador, precisamos testá-lo o mais rápido possível na maior quantidade de situações que pudermos. Desta forma, estaremos aumentando nosso vocabulário de recursos e já poderemos estabelecer mentalmente em que situações poderá valer a pena usá-lo.
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Fonte: http://www.musitec.com.br - Engenheiro Eletrônico: Fábio Henriques
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